A seguir reproduzimos uma entrevista do pesquisador e autor espírita Andrei Moreira sobre a homossexualidade à luz do Espírito Imortal:
1. Homossexualidade é
ou não uma doença à luz do Espírito imortal?
Desde
1973, a homossexualidade deixou de ser classificada como tal pela Associação
Americana de Psiquiatria. Em 1975 a Associação Americana de Psicologia adotou o
mesmo procedimento, deixando de considerar a homossexualidade como doença. No
Brasil, em 1985, o Conselho Federal de Psicologia deixa de considerar a
homossexualidade como um desvio sexual e, em 1999, estabelece regras para a
atuação dos psicólogos em relação à questões de orientação sexual, declarando
que “a homossexualidade não constitui
doença, nem distúrbio e nem perversão” e que os psicólogos não colaborarão
com eventos e serviços que proponham tratamento e cura da homossexualidade. No
dia 17 de Maio de 1990 a Assembléia-geral da Organização Mundial de Saúde
(sigla OMS) retirou a homossexualidade da sua lista de doenças mentais, a
Classificação internacional de doenças (sigla CID). Por fim, em 1991, a Anistia
Internacional passa a considerar a discriminação contra homossexuais uma
violação aos direitos humanos.
A
Homossexualidade, segundo a ciência, é uma orientação afetivo-sexual normal.
Sob o ponto de vista espírita, tem sido catalogada por muitos escritores
espíritas como doença ou distúrbio da sexualidade, em franco desrespeito ao
conhecimento científico atual. Não há base no conhecimento espírita para se
afirmar tal coisa. Não há uma visão que seja consenso sobre o assunto no
movimento espírita, mas há excelentes textos dos espíritos André Luiz e
Emmanuel nos direcionando o pensamento e a reflexão para o respeito,
acolhimento e inclusão da pessoa homossexual, entendendo a homossexualidade
como uma condição evolutiva natural (e o termo “natural” como sinônimo de
“presente na natureza”), decorrente de múltiplos fatores, sempre individuais
para cada espírito, construída ou escolhida pelo espírito, em função de tarefas
específicas ou provas redentoras, incluindo aí as condições expiativas e
reeducativas devidas a abusos afetivo-sexuais no passado, que parecem
ser a causa determinante da maior parte das condições homossexuais, segundo a
literatura espírita.
2. Qual a diferença
entre orientação e escolha sexual?
Orientação
sexual representa o desejo e o interesse afetivo-sexual (note bem: não somente
sexual, mas também afetivo) do indivíduo, decorrente de múltiplos fatores, os
quais determinam com qual sexo ele se sente realizado para uma parceria
íntima. A orientação sexual é fruto da história pessoal do indivíduo,
presente e passada; é influenciada pela cultura e pelas identificações
psicológicas, porém não controlada ou determinada conscientemente pelo
indivíduo. Nasce-se com ela. Escolha é fruto da decisão consciente de se viver
ou não a orientação, aceitá-la ou reprimi-la, de acordo com as idealizações e a
pressão familiar-social-cultural do meio em que o indivíduo se encontra reencarnado.
3. O homem homossexual
se sente uma mulher? A mulher homossexual se sente um homem?
De
forma alguma. Identidade e orientação sexual são coisas distintas. Identidade é
como o indivíduo se sente, a qual sexo pertence, com qual sexo se identifica
psicologicamente. A orientação homossexual representa exclusivamente o
direcionamento do afeto e do interesse sexual para indivíduos do mesmo sexo. O
homem homossexual tem a sua identidade masculina, sente-se homem, embora possa
ou não ter trejeitos afeminados, conforme sua história e identificação
psicológica. Igualmente, a mulher homossexual tem a identidade feminina, embora
possa ter ou não trejeitos masculinizados. Quando o indivíduo está em um corpo
de um sexo, e sua identidade é a do sexo oposto, dizemos que ele é transexual,
que é diferente do homossexual.
4. Em todos os casos, o
espírito já renasce homossexual? É possível reverter essa orientação?
Há
uma diferença entre comportamento homossexual e identidade afetivo-sexual
homossexual. Observamos comportamentos homossexuais em indivíduos com doenças
psiquiátricas, entre presidiários e soldados em guerra; nessas condições, na
ausência da figura feminina, a prática sexual entre iguais praticada por muitos
como campo de liberação das tensões sexuais e da busca do prazer. Isso não quer
dizer que eles sejam homossexuais. O indivíduo com identidade homossexual é
aquele que se sente atraído afetiva e sexualmente por pessoa do mesmo sexo, o
que pode ser percebido ou descoberto em diferentes fases da vida do indivíduo.
Não podemos afirmar que todos os homossexuais tenham nascido com essa
orientação, pois a variedade de manifestações nessa área nos remete a múltiplas
causas, embora a literatura mediúnica espírita nos informe de que em boa parte
dos casos as pessoas homossexuais trazem de seu passado espiritual a fonte de
sua orientação presente.
Não
sendo, em si, uma condição maléfica para o indivíduo, mas neutra, podendo ser
positiva ou não, dependendo da forma como for vivenciada, não há necessidade de
reverter essa condição. A orientação da ciência médica e psicológica atual é de
que o indivíduo homossexual que não se aceita e sofre com isso deve ser
classificado como portador de transtorno egodistônico, e os esforços devem se
direcionar no sentido de auxiliá-lo a se aceitar e se amar tal qual é,
sentindo-se digno de amor e respeito, buscando relações que lhe fortaleçam o
autoamor e nas quais possa ser natural, espontâneo e verdadeiro, em busca de
sua felicidade e de seu progresso.
Há
religiosos e profissionais fundamentalistas que oferecem terapia e assistência
espiritual, sobretudo em igrejas evangélicas, para que o indivíduo se “cure” da
homossexualidade. Não há registros de casos bem sucedidos. O que frequentemente
se observa são indivíduos bissexuais alterando o direcionamento do seu afeto
para indivíduos do mesmo sexo, porém muitos deles têm relações sexuais
clandestinas com pessoas do mesmo sexo e nos procuram nos consultórios cheios
de culpa, medo e vergonha por não se sentirem “curados”. Além disso, há os indivíduos
homossexuais que decidem vestir a máscara de heterossexuais e por algum tempo
formam famílias; frequentemente, saem de casa após algum tempo para viverem o
que sentem como sua real atração afetivo-sexual.
5. Existem casos de
homossexualidade desenvolvida exclusivamente pela educação na infância? Em caso
afirmativo, é possível reverter o processo?
Segundo
Freud, sim, o que não significa que seja passível de reversão ou que haja
necessidade disso. Segundo o Conselho Federal de Psicologia a identidade e a
orientação sexual estruturadas na infância não são passíveis de reversão, e a
homossexualidade não é uma condição que necessite reversão, já que não é uma
doença e muito menos um desvio moral.
Porém,
na visão espírita, os benfeitores espirituais nos informam que o espírito, ao
reencarnar, já escolhe a natureza de suas provas e as condições familiares
sociais e pessoais necessárias ao seu progresso, conforme sua consciência
indique a necessidade de reparação dos equívocos do passado e de melhoramento
pessoal. Em outras situações, quando o espírito não se encontra maduro para
definir suas provas, elas são estabelecidas por orientadores evolutivos, mas,
ainda assim, são definidas previamente à reencarnação. Assim, a família, o
corpo que a pessoa tem e os principais pontos da existência já estão definidos
para patrocinar as condições necessárias ao progresso do indivíduo. Além disso,
o espírito traz impressos em si o fruto de suas escolhas, o resultado de suas
experiências passadas, em seu psiquismo e no corpo espiritual, a determinar a
identidade e a orientação sexual da presente encarnação.
6. Muitos consideram
que a abstinência é uma recomendação educativa no caso de homossexualidade. O
que você acha?
Abstinência
não representa educação do desejo e da prática sexual. Contudo, pode ser uma
etapa necessária em certos casos, para a disciplina dos impulsos íntimos, de
heterossexuais e homossexuais, quando se percebam necessitados de controle do
desejo e da prática sem limites. Também pode acontecer que tenham a condição de
abstinência imposta pela misericórdia divina como recurso emergencial de
salvação perante circunstâncias de abusos reiterados nessa área.
Diz
Ermance Dufaux, no livro Unidos para o Amor: “Abstinência nem sempre é solução e pode ser apenas uma medida
disciplinar sem que, necessariamente, signifique um ato educativo. Por educar
devemos entender, sobretudo, a desenvoltura de qualidades íntimas capazes de
nos habilitar ao trato moral seguro e proveitoso com a vida. (…) A questão da
sexualidade é pessoal, intransferível, consciencial e a ética nesse campo passa
por muitas e muitas adequações”.
O
Espiritismo recomenda a todas as criaturas a conscientização a respeito da
sacralidade do corpo físico e da sexualidade, como fonte criativa e criadora,
destinada a ser fonte de prazer físico e espiritual, sobretudo de realização
íntima para o ser humano, em todas as suas formas de expressão.
Sintetiza
Emmanuel, na introdução do livro Vida e Sexo: “(…) em torno do sexo, será justo sintetizarmos todas as digressões nas
normas seguintes: Não proibição, mas educação. Não abstinência imposta,
mas emprego digno, com o devido respeito aos outros e a si mesmo. Não
indisciplina, mas controle. Não impulso livre, mas responsabilidade (grifos
nossos). Fora disso, é teorizar simplesmente, para depois aprender ou
reaprender com a experiência. Sem isso, será enganar-nos, lutar sem proveito,
sofrer e recomeçar a obra da sublimação pessoal, tantas vezes quantas se
fizerem precisas, pelos mecanismos da reencarnação, porque a aplicação do sexo,
ante a luz do amor e da vida, é assunto pertinente à consciência de cada um”.
7. O homossexual não
consegue de forma alguma ter atração por pessoa do sexo oposto ou isso pode
acontecer de forma natural?
Segundo
o relatório Kinsey, extensa pesquisa sobre o comportamento sexual humano
realizada nos EUA na década de 60 do século XX, pelo biólogo Alfred Kinsey,
tanto a homossexualidade como a heterossexualidade absoluta são condições raras
em nossa sociedade. A grande maioria das pessoas tem uma condição de desejo
predominante, em graus variáveis. Por exemplo, uma pessoa pode ser 80%
heterossexual e 20% homossexual ou vice-versa. É natural, portanto, que uma
atração heterossexual possa ocorrer na vida de um indivíduo homossexual, o que
muitas vezes é entendido pelo leigo como “cura” da homossexualidade.
Emmanuel
nos esclarece a respeito dessa realidade no livro Vida e Sexo, cap.21: “através de milênios e milênios, o Espírito
passa por fileira imensa de reencarnações, ora em posição de feminilidade, ora
em condições de masculinidade, o que sedimenta o fenômeno da bissexualidade,
mais ou menos pronunciado, em quase todas as criaturas. O homem e a mulher
serão, desse modo, de maneira respectiva, acentuadamente masculino ou
acentuadamente feminina, sem especificação psicológica absoluta.”
Podemos
compreender assim que todos os indivíduos trazem em sua intimidade a
possibilidade de se sentirem atraídos e se apaixonarem por alguém do mesmo sexo
(afinal de contas, a pessoa se apaixona por um indivíduo completo, e não
pelo seu corpo apenas). Isso não significa que vá ou necessite viver essa
situação. O psiquismo atende e responde ao impulso do espírito, que é
assexuado, mas que cumpre programas específicos em um ou outro sexo, conforme
definição anterior e necessidade evolutiva, inserido em um contexto
sociocultural que o limita na percepção e expressão do que vai em sua
intimidade profunda.
8. Homem ou mulher que
tenham fantasias com pessoas do mesmo sexo podem ser considerados homossexuais?
Na
adolescência as experiências homossexuais são naturais, definidas pela
psicologia como experiências de experimentação de uma identidade sexual em
formação; não atestam, necessariamente, a orientação homossexual. Já no adulto
a fantasia é uma das formas de expressão do desejo e da atração homoafetiva e
atestam a intimidade da criatura, mesmo que não sejam aceitas pela
personalidade consciente.
9. Qual sua avaliação
sobre como a comunidade espírita trata a homossexualidade?
Em
geral, observamos uma abordagem superficial e discriminatória por parte da
comunidade espírita com os homossexuais e a homossexualidade. É compreensível
que seja assim, pois todo meio religioso lida com idealizações e preconceitos
seculares. Todavia, tal postura pode ser modificada por meio do que recomenda
Allan Kardec: estudo sério e aprofundado de um tema para que se possa opinar
sobre ele. É lamentável que nós, adeptos de uma fé raciocinada, nos permitamos
o mesmo comportamento dos religiosos fundamentalistas.
Observa-se
muita opinião pessoal sem fundamento tomada como regra e lei. Tais opiniões
costumam ser destituídas de compaixão e amorosidadee terminam por isolar o
indivíduo homossexual, taxando-o de doente, perturbado, promíscuo e/ou
obsediado. Às vezes ele é até mesmo afastado das atividades espíritas
habituais, como se fosse portador de grave moléstia que devesse receber
reprovação e crítica por parte da parcela heterossexual “normal” da sociedade.
Tais posturas são frequentemente embasadas no tradicional preconceito
judaico-cristão-ocidental de que a única e exclusiva função da sexualidade é a
procriação humana, tomando a parte pelo todo.
O
Espiritismo é uma doutrina livre e libertária, compromissada com o entendimento
da natureza íntima do ser humano e o progresso espiritual. Nos dá bases muito
ricas de entendimento do psiquismo e da sexualidade do espírito imortal, como
instrumentos divinos dados por Deus ao homem para seu aprimoramento e
felicidade. Além disso, nos oferece esclarecimento a respeito das condições e
situações determinadas pela liberdade do homem, que desvia esses instrumentos
superiores de suas funções sagradas.
É
imprescindível que se extinga em nosso movimento o preconceito e que os
homossexuais tenham campo de trabalho, se dediquem ao estudo e à prática da
doutrina espírita, com a mesma naturalidade de heterossexuais. Isso, para que
compreendam o papel de sua condição em seu momento evolutivo e a utilizem com
respeito e dignidade com vistas ao equacionamento dos dramas internos, ao cumprimento
dos planos de trabalho específicos em sua proposta encarnatória e ao seu
progresso pessoal, da família e da sociedade da qual faz parte, da mesma
maneira como deve fazer o heterossexual.
10. Como
devem se comportar os pais espíritas de um indivíduo que se descubra
homossexual?
Aos
pais de uma pessoa homossexual cabe o acolhimento integral e amoroso do
indivíduo, com aceitação de sua condição, que nada mais é que uma das
características da personalidade. Ser homossexual não é sinônimo de ser promíscuo,
inferior, afeminado (para homens) ou masculinizado (para mulheres).
Simplesmente atesta que o indivíduo se realiza sexual e afetivamente no
encontro entre iguais. A pessoa homossexual deve receber a mesma instrução e
educação a respeito da sexualidade que os heterossexuais, a fim de bem
direcionar as suas energias e esforços no sentido da construção do
afeto com quem eleja como parceiro (a). A postura na vivência da
sexualidade, para homossexuais, deve ser a mesma aconselhada pelos
espíritos a heterossexuais: dignidade, respeito a si mesmo e ao outro,
valorização da família, da parceria afetiva profunda no casamento e dedicação
da energia sexual criativa em benefício da comunidade em que está inserido.
O
acolhimento amoroso da família é fundamental para que o indivíduo homossexual
possa se aceitar, se compreender, entendendo o papel dessa condição em sua vida
atual, e para que se sinta digno e responsável perante suas escolhas. A luta,
para aqueles que vivem essa condição, é grande, a fim de afirmar a sua
autoestima em uma sociedade que banaliza a condição sexual e vulgariza a
diferença. A família é o núcleo onde se encontram corações compromissados em
projetos reencarnatórios comuns, com vínculos pessoais de cada um com o passado
daqueles que com eles convivem, devendo ser cada membro dessa célula da
sociedade, um esteio para que o melhor do outro venha à tona, por meio da
experiência amorosa.
11. Gostaria de
acrescentar algo?
Romanos
14:14 “Eu sei, e estou certo no Senhor Jesus, que nada é de si mesmo
imundo a não ser para aquele que assim o considera; para esse é imundo.”
Todas
as experiências evolutivas onde estejam presentes o autorrespeito, a
autoconsideração, a autovalorização e o autoamor são experiências evolutivas
promotoras de progresso e evolução, pois aquele que se oferece essas condições
naturalmente as estende ao outro na vida. A homossexualidade, independentemente
da forma como se haja estruturado como condição evolutiva momentânea do
indivíduo, pode ser vivenciada com dignidade e ser um rico campo de
experimentação do afeto e construção do amor, desde que aqueles que a vivam se
lembrem de que são espíritos imortais e de que a vida na matéria é tempo de
plantio para a eternidade, no terreno do sentimento e das conquistas evolutivas
propiciadas pelo amor, em qualquer de suas infinitas manifestações.
Diz-nos
Emmanuel no livro Vida e Sexo, lição 21:
“A coletividade humana aprenderá, gradativamente, a compreender que os
conceitos de normalidade e de anormalidade deixam a desejar quando se trate
simplesmente de sinais morfológicos, para se erguerem como agentes mais
elevados de definição da dignidade humana, de vez que a individualidade, em si,
exalta a vida comunitária pelo próprio comportamento na sustentação do bem de
todos ou a deprime pelo mal que causa com a parte que assume no jogo da delinquência.”
E
complementa André Luiz, no livro Sexo e destino – Cap. 5: “(…) no mundo porvindouro os irmãos
reencarnados, tanto em condições normais quanto em condições julgadas anormais,
serão tratados em pé de igualdade, no mesmo nível de dignidade humana,
reparando-se as injustiças achacadas, há séculos, contra aqueles que renascem
sofrendo particularidades anômalas, porquanto a perseguição e a crueldade com
que são batidos pela sociedade humana lhes impedem ou dificultam a execução dos
encargos que trazem à existência física, quando não fazem deles criaturas
hipócritas, com necessidade de mentir incessantemente para viver, sob o sol que
a Bondade Divina acendeu em benefício de todos.”.
Nenhum comentário:
Postar um comentário