Justiça Divina: alívio para as dores, estímulo para o acerto

Por: Arísio Antonio Fonseca Junior
 “Porque o Filho do homem virá na glória de seu Pai, com os seus anjos; e então dará a cada um segundo as suas obras”. Evangelho de Mateus, 16.27.
“E eis que cedo venho, e o meu galardão está comigo, para dar a cada um segundo a sua obra”. Apocalipse 22.12.
Muitas pessoas rebelam-se em face das dores que as assaltam quotidianamente. Chegam, algumas vezes, a proferir autênticas blasfêmias, acusando Deus de ser injusto e mau Pai, por “deixar que sofram tanto”.
Sem embargo do erro de perspectiva em que se encontram os indivíduos que assim se comportam, não se deve julgá-los. Deveras o sofrimento de muitos é sincero, as dores são latejantes, o que os leva algumas vezes a atitudes infelizes, com consequentes futuros infelizes. Os conhecedores da Doutrina Espírita têm, neste ponto, vantagem de panorama sobre os demais, pois sabem da Justiça Divina, em sua forma mais sublime que se possa expressar.
Os Iluminados Espíritos afirmaram a Allan Kardec ser Deus “soberanamente justo e bom”. Significa dizer que o Pai e Criador é suprema e absolutamente, sem restrições e sem neutralização de qualquer gênero, justo e bom. “Para estar acima de todas as coisas, Deus tem que se achar isento de qualquer vicissitude e de qualquer das imperfeições que a imaginação possa conceber.” (1) Assim, os atributos de justiça e bondade, nos aspectos divinos da criação, além de serem em seu infinito grau de perfeição, andam sempre juntos. Não é possível conceber Deus apenas justo, nem somente bom. Ou se terá um ser (em minúscula, pois não será Deus) aplicador de sanções retributivas do mal pelo mal, ou será um ente demasiado permissivo, protetor de erros e acertos igualmente, sem mérito para os que acertam e sem responsabilidade para os que erram.
Dado que devem ser, necessariamente, conexas as qualidades de justiça e bondade de Deus, algo existe que seja efeito dessa união. Equívocos e concertos devem produzir resultados diversos nos caminhos do Espírito. E assim se dá, embora a destinação de todos seja a mesma, ao final.
Cabe, inicialmente, a exemplo da parábola dos lavradores maus, contada por Jesus, dizer que a “sebe” já existe. A cerca para nossas ações foi posta por Deus desde os tempos que ainda não nos é dado conhecer: Suas leis benditas foram, são e serão as mesmas, e é nisso em que consiste o “milagre”, conforme Kardec deixa explícito em A Gênese. A Lei Natural ou Divina (O Livro dos Espíritos, Parte Terceira), gravada na consciência de cada Espírito, é a diretriz do Direito Divino para o comportamento que leva à perfeição relativa. Andar ou não de acordo com as Leis de Deus, algumas delas catalogadas na Parte Terceira de O Livro dos Espíritos (2), é o que provoca as dores ou os gozos atuais e futuros do ser.
Têm-se, então, duas das palavras-chaves no estudo da Justiça Divina: Lei e livre-arbítrio. A primeira, como manifestação da perfeição de Deus, cuja origem é o amor, de onde tudo vem e para onde tudo se encaminha. As Leis Divinas conformam irrepreensivelmente todas as relações entre os elementos do Universo. Harmonizar-se ou desconcertar-se delas é o que determina a evolução do Espírito ou a repetição das experiências. Aí se encontra a segunda, livre-arbítrio, pelo que todo indivíduo, a partir de seus conhecimentos vivenciais, pode escolher as atitudes que desejar, sabedor de que cada opção provoca uma conseqüência e requer a responsabilidade que dela advém (3).
Feita a escolha entre a “porta estreita”, que é a concordância com a Lei, e a “porta larga”, desviante do caminho da evolução, cabe ao Espírito receber a consequência de seus atos. Emana, assim, a terceira palavra-chave, que, embora sendo também Lei, é destacada pela relevância no assunto em estudo: Lei de causa e efeito. Neste ponto, se Deus fosse apenas justo, condenaria aqueles que preferiram a segunda porta e exaltaria os outros, optantes pela porta da liberdade e salvação. Entretanto, como visto, o Pai não é somente justo, senão justo e bom. Aí está o alívio para as dores e para os sofrimentos; e, também, a quarta e última palavra-chave da Justiça Divina adotada para o estudo: reencarnação (4).
Reencarnação como oportunidade! Oportunidade de refazer o caminho; ensejo para adequar os passos à estrada que conduz a Deus. A reencarnação é a demonstração mais clara dos atributos de Deus aqui tratados: Justiça e Bondade. Somente através das novas oportunidades de acerto para os que erram e da evolução para aqueles que bem se conduzem é que se pode afirmar ser infinita, soberana e perfeita a Justiça Divina. Se antes o comportamento não era consentâneo às prescrições divinas, hoje – o momento ideal – existe a nova ocasião de se conduzir de acordo com a Lei. Porventura já andava em conformidade com a Lei, hoje é nova oportunidade para permanecer nela e engrandecer o conhecimento e a emoção.
As dores e os sofrimentos, inicialmente mencionados, podem existir, e existem, pois que consequências do nosso mau proceder no passado. Esqueça! O passado não é mais do que um quadro para dele retirar experiência a fim de atingir o crescimento. Importa, agora, agir no bem sem cessar, “tendo antes de tudo ardente amor uns para com os outros, porque o amor cobre uma multidão de pecados” (5). Assim, passando pelas dores atuais, sendo “bem-aventurados aflitos” (6), e praticando o amor como Jesus nos ensinou e nos incitou, amando-nos uns aos outros como Ele nos amou, teremos a felicidade daqueles que escolhem a porta estreita: evolução, proximidade dos planos celestes da criação.
Jamais foi pretensão esgotar um assunto tão belo e tão consolador. São linhas de alguma meditação e muita emoção, ao pensar em como Deus, Pai excelso e amantíssimo, trata igualmente Seus filhos, oportunizando a todos a vida plena de felicidade, aos que acertam e aos que erram. Por isso acerta Allan Kardec ao afirmar que “se, entretanto, não tivermos em vista apenas a vida atual e, ao contrário, considerarmos o conjunto das existências, veremos que tudo se equilibra com justiça” (7).

Referências:
(1) Questão 13, de O Livro dos Espíritos.
(2) São as Leis Morais arroladas na Parte Terceira de O Livro dos Espíritos: Lei de Adoração, Lei do Trabalho, Lei de Reprodução, Lei de Conservação, Lei de Destruição, Lei de Sociedade, Lei do Progresso, Lei de Igualdade, Lei de Liberdade e Lei de Justiça, Amor e Caridade.
(3) Proveitosa para o entendimento da Justiça Divina a leitura da questão 964, de O Livro dos Espíritos, tanto a resposta dos Espíritos, quanto o comentário pertinente feito por Allan Kardec à pergunta e à resposta.
(4) Interessantes os esclarecimentos do Espírito S. Luís a esse respeito, no item 25, do capítulo IV, “Ninguém poderá ver o reino de Deus se não nascer de novo”, de O Evangelho segundo o Espiritismo.
(5) 1ª Carta de Pedro 4.8.
(6) “Bem-aventurados os aflitos pode então traduzir-se assim: Bem-aventurados os que têm ocasião de provar sua fé, sua firmeza, sua perseverança e sua submissão à vontade de Deus, porque terão centuplicada a alegria que lhes falta na Terra, porque depois do labor virá o repouso. – Lacordaire. O Evangelho segundo o Espiritismo, capítulo V, item 18.

(7) O Evangelho segundo o Espiritismo, capítulo XVI – “Não se pode servir a Deus e a Mamon”, item 8.
  

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